sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O Juiz e a Constituição (Parte 1)


Aproveito a temática tratada na semana anterior para, a partir desta, ressaltar algumas razões pelas quais considero de extrema gravidade, responsabilidade e relevância a escolha de um ministro para ocupar uma das cadeiras da Suprema Corte brasileira.
Parte disso está relacionado com o próprio papel desempenhado pelo Poder Judiciário em nossa sociedade contemporânea e, de forma mais específica, com a importância da delicada, porém extremamente importante, relação que os juízes guardam com a maior de todas as leis, a Constituição.
Isso se deve, em parte, à própria estrutura do nosso sistema constitucional que tem no Judiciário, em razão de sua natural vocação à neutralidade política (comparado aos demais poderes, Legislativo e Executivo), o nobre encargo de garantir que seja respeitada a supremacia da Constituição, herança que recebemos da tradição constitucionalista norte americana, principalmente.
A importância desta função desempenhada pelo Judiciário ganha ainda maior relevância quando notamos, hoje em dia, a onipresença da Constituição (SANCHIS, L. P. Neoconstitucionalismo y ponderacion judicial, p. 131) em praticamente todas as áreas do Direito e dos temas que guardam relação com os mais diversos conflitos que, muitas vezes, somente podem encontrar solução definitiva ao ser apreciada pelo Supremo Tribunal Federal.
Eis, aí, por óbvio, a relevância e a necessidade de possuirmos bons julgadores  na composição da mais alta Corte de nosso país (ressalva que, desde já, devo fazer para, mais adiante, tratar de forma destacada, a atual composição do STF e o mecanismo utilizado para tanto).
Mas não é só no âmbito do STF que as questões de ordem constitucional são apreciadas e daí a razão de se considerar, talvez, ainda mais importante o papel que os juízes de primeira e segunda instância desempenham ao lidar com a norma constitucional.
E isto, nos dias de hoje, deve se dar na quase totalidade dos casos que lhes chegam à apreciação.
Como dito alhures, a supremacia da Constituição tem o poder de irradiar sobre todo o ordenamento a necessária análise de toda e qualquer norma infraconstitucional à luz do texto constitucional, sob pena de ser considerada inválida.
Além disso, quando a norma que está a ser analisada encontra-se no rol dos direitos fundamentais essa característica torna-se ainda mais evidente.

Considerando-se que na atualidade quase nenhuma controvérsia resta quanto à eficácia destes direitos no âmbito das relações privadas, exige-se dos juízes e tribunais  um cuidado ainda maior no momento de se analisar, por exemplo, o descumprimento de uma obrigação ou um contrato, haja vista a possibilidade de estarem envolvidos interesses que transcendem a esfera meramente civil.
Vale lembrar, ainda, que a função jurisdicional não fica adstrita apenas à cotidiana interpretação e aplicação das leis nos casos concretos, sendo que, a todo juiz ou tribunal cabe a determinação do sentido da Constituição quando diante de um conflito que envolva a constitucionalidade de uma determinada norma que esteja em nítido confronto com as normas que compõe o texto constitucional.
É o que se denomina controle difuso ou incidental de constitucionalidade.
Em tais casos, como se sabe, necessário um profundo conhecimento por parte do magistrado dos princípios e regras constitucionais que visam, acima de tudo, a manutenção da força normativa da Constituição tal como preconizado pro Konrad Hesse no sentido de ser dada preferência a soluções que tornem as normas da Constituição o mais eficazes e permanentes possível.
Acredito ser essa atribuição a principal razão, a mais certa garantia de podermos conviver em uma sociedade que valorize não apenas escolhas democráticas, livre de riscos de alguma manobra que, porventura, possa subverter a ordem social que já conquistamos, mas além disso, que garanta a manutenção de tais escolhas desde que em consonância com a maior de todas as leis.
Para tanto, há que se ter decisões e atos abalizados na própria Constituição que, dado o seu caráter rígido, não permite que interesses meramente políticos ou mesmo de maiorias eleitorais (ou “eleitoreiras”) comprometam, por meio de indesejáveis reformas, as conquistas jurídicas, políticas e sociais que hoje dispomos.
E são justamente tais apontamentos que nos trazem, mais uma vez, à questão que envolve a escolha de um ministro do STF que, no que se refere à guarda da Constituição, detém o poder de última análise (além da competência originária para análise das ações constitucionais - ADI, ADC, ADPF, etc).
Não obstante, enquanto juízes, em início de sua carreira, para receberem esta importante e nobre missão constitucional, necessitam passar por longo e dificultoso concurso de provas e títulos, a nomeação de um Ministro do STF depende, única e tão somente, de uma indicação que todos sabem ser de natureza puramente política.
Será esse um modelo de escolha que melhor se coaduna com a relevante missão desta Corte?

Garante, de forma efetiva, a imparcialidade que deve ser inerente à função do magistrado?
Neste sentido, inclusive, tem sido esta preocupação que tem feito com que os bolivianos discutam um novo e, porque não dizer, inusitado sistema de escolha de juízes de tribunais, inclusive os membros da Corte Constitucional.

Tal escolha será feito por meio de eleições populares (ConJur, 19/01/2011) o que, todavia, parece não ser do consenso de uma boa parcela de membros de outros tribunais constitucionais (como se pode constatar pelos relatos contidos na própria matéria indicada).
De qualquer forma, não seria o caso de passarmos também a refletirmos e pensarmos em uma novo mecanismo ou modelo de escolha de nossos ministros?
Com certeza toda a sociedade ganharia com isso e, por certo, teríamos garantida, sem qualquer desprestígio ao atual grupo de Ministros que compõem o Supremo atualmente, uma melhor guarida à nossa Lei Maior.

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